Magros de Mondim


(Texto elaborado por Fernando V. Magro para ser lido no encontro de Magros que não chegou a realizar-se em Agosto de 2012, nas Termas de Monfortinho.)


A família Magro teve origem, como é sabido, em Gonçalo Viegas, bisneto de Egas Moniz, que por ser muito esbelto de figura foi cognominado de Magro.

A família de Egas Moniz e a sua descendência teve muita notabilidade em toda a primeira dinastia do Reino de Portugal.

D.Egas, além de ter criado e educado o nosso primeiro Rei, foi mais tarde também seu conselheiro. Um dos seus filhos de nome D. Lourenço Viegas foi Alferes-mor do exército de D.Afonso Henriques. E o seu bisneto Gonçalo Viegas Magro foi mestre em Évora da Ordem Militar de Calatrava constando no testamento de D.Afonso Henriques que lhe é reservada a importância de 10.000 maravedis para serem gastos em utilidade na defesa da cidade de Évora se for necessário. E o filho do referido Gonçalo Viegas Magro, de nome Lourenço Gonçalves Magro, espírito ilustrado e probo, foi quem D.Afonso III escolheu para educar o seu herdeiro D.Diniz na sua infância.

Teve D.Diniz outros educadores como Nuno Martins de Chacim e os professores Domingos Jardo e Aymeric d'Ehrard, este natural da Aquitânia, profundo conhecedor e provavelmente cultor da poesia provençal, tendo possivelmente influenciado D.Diniz na criação poética.

Ao descendente de Egas Moniz - Lourenço Gonçalves Magro - o nosso Rei, responsável pela plantação do pinhal de Leiria, ficou sempre muito reconhecido tendo-o recompensado com a doação da Vila de Arêga - hoje Caldas de Aregos - situada junto ao Rio Douro, nas proximidades de Resende.

A respeito dessa recompensa diz Frei António Brandão o seguinte:


"Deu-lhe D.Diniz esta vila por ter sido aio seu. E ainda que, anos adiante, fizera geral revogação das mercês que fizera nos princípios do seu reinado, conservou, todavia, a Lourenço Gonçalves Magro o referido senhorio de Arêga, como consta duma ractificação feita em 9 de Novembro de 1286 da seguinte forma:

"Como eu desse a Lourenço Gonçalves Magro, meu aio por criança e por serviços que me fez, em doaçom a Vila de Arêga e eu revogasse todas as doações, não foi entam minha intençom, nem hé, que revogue essa doaçom. Tudo merece um bom aio e mestre."


Refere o Dr.Cerqueira Magro, de Mondim de Basto, a páginas 89 e 90 do seu livro Fonte de Juvêncio, que Lourenço Gonçalves Magro viveu em Arêga durante longos anos com sua família. Na página 137 do mesmo livro diz o seguinte:


"Os Magros de Mondim e ainda os de Montalegre, segundo a tradição, descendem dele. Não sei se no Sul há alguma família que use esse apelido".(fim de citação).


O Dr. António Manuel Cerqueira Magro de seu nome completo, pertence ao ramo dos Magros de Mondim de Basto. Foi médico e proprietário do Sanatório do Seixoso, próximo da estação de caminho de ferro de Caíde, na linha do Douro.

Nos primeiros dias de Julho de 1905 convidou a Imprensa da cidade do Porto a ir visitar o seu Sanatório. Sobre esse acontecimento refere o jornal "O Primeiro de Janeiro" o seguinte:


"Os jornalistas saíram pela manhã nos carros dos conhecidos desportistas José Saraiva e Benedito Ferreirinha. A velocidade foi alucinante, rondou os cinquenta quilómetros em pouco mais de quatro horas de corrida do Porto ao magnifico Alto do Seixoso, onde foram recebidos pelo proprietário do Sanatório, Dr.Cerqueira Magro e pelo director clínico Dr.João Ferreira.

A todos impressionou o asseio e a limpeza da Instância para além da maravilhosa vista do Marão. Quem desejar visitar o Sanatório deverá apanhar o comboio em S.Bento e desembarcar na estação de Caíde, que logo ali terá um landau de transporte ao Sanatório.." - refere a notícia do referido jornal "O Primeiro de Janeiro".


No seu livro o Dr.Cerqueira Magro refere na página 137 que conheceu em Lisboa o Senhor Abílio Magro escrivão de direito, pertencendo ao ramo dos Magros de Montalegre.


"Ainda há meses, relata o autor, encontrando-me com ele na Brasileira do Chiado, enquanto me referia peripécias interessantes de um processo célebre, que corria nos tribunais da capital, ao contemplá-lo de lado, eu reconhecia que estava ali um autêntico perfil dos cavaleiros dos tempos Afonsinos. No Porto vive um médico, o Dr. Alberto d'Almeida Magro, primo do anterior e, portanto, pertencendo ao ramo dos Magros de Montalegre.

Soube, há pouco tempo, que é eminente no dedilhar a "prima" e o "bordão" da guitarra. Esta circunstância aproxima-o dos Magros de Mondim"
(fim de citação).


O escrivão Abílio Magro era primo direito do meu avô e o médico Dr.Alberto Magro meu tio avô. Sobre a faceta de bom guitarrista deste último lembro-me de uma história que me contava o meu pai. Esse seu tio tinha uma quinta na margem direita do Rio Douro, próximo da Régua, denominada Quinta de Bagaúste, junto à actual barragem do mesmo nome. O meu tio-avô Alberto fazia a viagem até à Régua de comboio e da Régua até à sua quinta fazia o percurso a cavalo pela encosta difícil do Rio Douro.
Tendo em vista a procura de uma solução que servisse a sua quinta em melhores condições de acessibilidade convidou o meu pai (seu sobrinho) para passar uns dias no Douro procurando ajuda da sua parte no sentido de que ele lhe pudesse dar uma ideia para melhorar o acesso à sua propriedade, dado que o meu pai era diplomado em engenharia pela Escola Politécnica do Porto. Desses dias passados em Bagaúste tinha o meu pai uma bela recordação que não deixou de me transmitir por diversas ocasiões.

Ao fim do dia, com a Lua e as estrelas a espelharem-se nas águas do Rio Douro, o tio Alberto puxava da sua guitarra e tocava na varanda da sua casa, noite dentro, longos trinados. Era, segundo o meu pai, um inesquecível prazer ouvi-lo tocar naquele ambiente de sonho.

Por ter referido na Fonte de Juvêncio desconhecer a existência de famílias ao Sul de Portugal com o apelido Magro o Dr. Cerqueira Magro recebeu algumas cartas que o esclareceram sobre o assunto. De Augusto Ataíde Moreira chegou-lhe em Outubro de 1927 uma missiva que referia o seguinte:


"Comprei há dias o interessante romance da autoria de Vª.Exª. Fonte de Juvêncio onde na página 137 se lê: - Não sei se a Sul do país há alguma família que use o apelido Magro - . Eu tenho o prazer de participar a Vª.Exª. que há, e houve mais Magros no País, pois minha mãe chama-se Maria das Dores de Ataíde Magro e a minha bisavó Luísa era filha do Bacharel Manuel José de Ataíde Magro, Morgado do Candal, S.Paio de Oleiros, Vila da Feira.
Este meu 3º.avô era filho de João Afonso Magro e de D.Luisa Gonçalves Martins Magro, naturais de S.Domingos de Malpica, Castelo Branco. Estes eram meus quartos avós.
A Quinta do Candal tinha, no portão de entrada, o brasão dos Magros e Gonçalves em pedra de Ançã.
Há anos foi o portão modificado e apeado o escudo, que pedi aos proprietários na altura e tenho em minha casa, na mesma freguesia de Oleiros.
Remeto incluída uma fotografia que tem o leopardo do timbre partido e onde se vêem as armas dos Magros e Gonçalves".


Esta interessante carta, refere o Dr.Cerqueira Magro num opúsculo que escreveu sobre Egas Moniz e seus descendentes, constituiu para ele uma verdadeira revelação. Depois de a ler ficou convicto de que estes Magros do Candal e de Malpica são os descendentes directos do aio de D.Diniz, Lourenço Gonçalves Magro.

Refere ainda o Dr.Cerqueira Magro que o Senhor Ataíde Moreira lhe diz numa outra carta estar persuadido de que existe ligação entre os seus Magros de Malpica e os de Mondim de Basto e que na altura em que escreveu ainda existiam Magros em Castelo Branco.

Concluindo:

Parece, pelo que atrás foi referido, haver três ramos de Magros:

- Os Magros de Montalegre;
- Os Magros de Mondim de Basto;
- Os Magros de Malpica.

E provavelmente são todos descendentes de Gonçalo Viegas Magro, bisneto de Egas Moniz.

Os Magros espalharam-se por diversas regiões do País e até pelo estrangeiro. Há notícias de em Évora ter vivido um Capitão Fernando Magro e no tempo de D.Afonso V residiu também em Évora Gil Gonçalves Magro, conforme epitáfio na sua sepultura na capela da Trindade no Mosteiro de São Domingos.
Também se sabe que no reinado de D.Afonso VI viveu ainda na mesma cidade de Évora D.Henrique Fernandes Magro, cavaleiro e rico-homem.
Fora do país, em Espanha, é natural que haja alguns Magros possivelmente descendentes daqueles que tendo sido perseguidos por D.Pedro I, o Justiceiro, se refugiaram nesse território. É que o Meirinho-Mor de D.Afonso IV de nome Pêro Coelho tendo sido um dos responsáveis pela morte de Inês de Castro, era sobrinho de Gonçalo Viegas Magro dado que era filho de um seu irmão de nome Soeiro Viegas Coelho (da Quinta da Coelha).

Sendo Portugal e Espanha os principais países descobridores dos novos Mundos, natural terá sido que alguns Magros a viver num ou no outro país tivessem feito parte dos contingentes das armadas descobridoras e colonizado as novas terras.
Mais tarde, pelos séculos fora, é possível que outros tenham emigrado para os países de África e da América Central e do Sul. Em Malta é conhecido que existe um grupo apreciável de Magros. A explicação para esse facto julgo dever-se à Ilha ter sido governada pelos cavaleiros de S.João de Jerusalém - depois chamados Cavaleiros de Malta - que entre os seus Grão-Mestres, teve os seguintes portugueses em épocas diferentes:

-D.Afonso de Portugal, entre 1203 e 1206;
-Luis Mendes de Vasconcelos, entre 1622 e 1623;
-António Manuel de Vilhena, entre 1722 e 1736;
-Manuel Pinto da Fonseca, entre 1741 e 1773.

Gostaria, agora, de referir algumas figuras relativamente recentes dos Magros de Montalegre, a que pertenço.

Por ordem cronológica começo por Abílio da Cruz Pereira Magro, primo direito do meu avô paterno que foi já referido anteriormente. Foi escrivão do processo do regicídio de 1908, regicídio de que foram vítimas o Rei D.Carlos e o seu filho o príncipe herdeiro D.Luis Filipe. O mesmo Abílio Magro participou no movimento iniciado por Paiva Couceiro tendo em vista a restauração da Monarquia e foi pai de uma figura pública dos anos 50 e 60 do século passado: a locutora da Emissora Nacional e apresentadora da Radiotelevisão Portuguesa, Maria Leonor Leite Pereira Magro. O primo direito do meu pai, o economista Acácio Manuel Pereira Magro foi ministro do 3º.Governo Constitucional presidido pelo Engenheiro Nobre da Costa, do 4º.Governo Constitucional presidido pelo Dr.Mota Pinto e ainda ministro do 5º.Governo Constitucional presidido pela Engenheira Maria de Lourdes Pintassilgo. E o meu primo direito Arqtº. Álvaro Magro de Moura Bessa, dono da Civilização Editora do Porto e da Empresa Editora do Minho de Barcelos, foi agraciado em 10 de Junho de 1994 pelo Dr.Mário Soares, quando Presidente da República, com o grau de comendador da Ordem do Infante D.Henrique pelo seu desempenho como editor, em prol da cultura.

Em minha casa houve sempre por parte do meu pai a referência ao facto da nossa família descender de Egas Moniz, aio de D.Afonso Henriques. De tal forma era convincente o seu discurso sobre essa ligação que o meu filho Fernando Manuel facilmente a interiorizou. De tal forma que quando na sua quarta classe da instrução primária com 9/10 anos de idade a sua professora se referiu, pela primeira vez, a D.Egas Moniz ele imediatamente acrescentou:
- Esse sei eu quem é porque é meu parente.
A professora riu-se com a afirmação do miúdo e não acreditou nas suas palavras lembrando-lhe que D.Egas Moniz tinha vivido há oitocentos anos. O meu filho Fernando Manuel retorquiu-lhe:
- Ai não acredita, pergunte ao meu pai.
A referida professora, passados alguns dias, num encontro casual comigo, referiu-me o que se havia passado na aula de história quando falou do 1º.Rei de Portugal e do seu aio D.Egas Moniz. Esclareci-a, então, acerca da proveniência do apelido de família Magro que a tradição diz ter sido usado por um bisneto de Egas Moniz e ela conformou-se com a minha explicação.

Para terminar esta minha breve contribuição sobre a origem da família Magro e dos seus actuais ramos não quero deixar de referir, como fazedor de versos, a inclinação para a poesia dos Magros de Montalegre. Meu avô paterno Abílio Pereira Magro escrevia versos, bem como o meu tio Fernando, irmão de meu pai. E os meus tios-avós Alberto e Artur são autores de um livro de poesia editado, a titulo póstumo, pelo seu irmão Abel.
É possível que esta inclinação tenha uma origem muito antiga. Um sobrinho de Gonçalo Viegas Magro, filho do seu irmão Soeiro Viegas (que tomou o apelido de Coelho por ser dono da Quinta da Coelha, solar com torre, localizada em Cinfães) foi um dos maiores poetas do seu tempo. Esse sobrinho do primeiro Magro chamou-se João Soares Coelho e foi, entre os seus contemporâneos, um dos poetas de maior produção literária. Nos diferentes cancioneiros constam da sua autoria 22 cantigas de amor, 15 cantigas de amigo e 11 de escárnio e maldizer. Descendente de Egas Moniz esteve ao lado de D.Afonso III na conquista do Algarve.
Uma das suas cantigas de maldizer é a primeira poesia erótica que se conhece escrita em português. O trovador, já velho, perante as arremetidas de Luzia Sanchez, muito mais nova, diz que se pudesse fazer amor com ela fá-lo-ia.

"Por Deus, Luzia Sanchez, Dona Luzia
Se pudesse fazer amor convosco fá-lo-ia.
Deu-me o Demo o membro viril cativo,
Que de gran, semelha mais morto que vivo,
E, se me ardesse a casa, non s'ergueria.
Por Deus, Luzia Sanchez, Dona Luzia
Se eu pudesse fazer amor convosco fá-lo-ia".

O que ele queria dizer era que Dona Luzia não devia esperar dele o que já não lhe podia dar. Porque nem com o calor da sua casa a arder o seu membro viril (a que chama pissuça) se ergueria. Não podia, por isso, fazer amor com ela.

Julho de 2012
Fernando V. Magro

(Nota: Nos versos acima, as palavras a negrito são uma adaptação do autor do texto de modo a não ferir susceptibilidades.)
AM


Encontraram-se registos da presença de Magros em Mondim de Basto no século XVIII - Francisco José Magro que casou com Maria Caetana Teresa Ribeiro e tiveram o filho Francisco Xavier Magro que casou a 19/12/1773 em Mondim de Basto, todos ascendentes directos da família Cerqueira Magro.

Este será, portanto, o ramo dos Magros de Mondim de Basto.

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